Objetivo do estudo
A formação de profissionais de saúde ocorre em instituições educacionais e dentre elas as de ensino superior que devem estar articuladas ao serviço público de saúde. Essa articulação denomina-se integração ensino e serviço, está prevista nas políticas de saúde e educacionais e objetivam a formação de acordo com os princípios do SUS. Um dos princípios é a integralidade, que preconiza o atendimento às pessoas, com ações integradas e colaborativas, que possam promover e recuperar a saúde e prevenir a doença. Para tanto, se faz necessário que o modelo de formação e atendimento seja integrado e colaborativo. Isso é o que propõe a Educação Interprofissional (EIP).
A integração e colaboração precisam ser (re)aprendidas, e neste cenário estão duas instituições, uma educacional e outra de serviços de saúde, geridas e ancoradas por políticas públicas e finalidades distintas, porém com compromissos que se complementam.
Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi estudar os conceitos e processos da Gestão do Conhecimento (GC) e alinhá-los aos da EIP, com vistas à uma futura integração entre o ensino e os serviços em saúde, que possa promover a formação de melhores profissionais de saúde e a melhoria da qualidade na atenção à saúde das pessoas.
A proposta deste alinhamento estabelece um fluxo de conhecimento para que a EIP seja implementada na formação, articulados e integrados aos serviços públicos de saúde.
Relevância/originalidade
Para que a integração ensino e serviço ocorra, e que neste contexto a EIP seja a facilitadora no processo de formação de profissionais qualificados para atuar em equipes interprofissionais, se faz necessário que a gestão pública de saúde e as instituições formadoras estabeleçam um fluxo de conhecimentos de maneira que as políticas públicas de ensino e saúde sejam contempladas em todo processo. Neste contexto, o alinhamento dos conceitos de GC e EIP buscaram estabelecer um fluxo de conhecimento para que a EIP seja implementada nos processos de formação de novos profissionais, articulados e integrados aos serviços públicos de saúde. A tarefa se apresentou como desafiadora, pois os conceitos e processos da GC são adotados no contexto empresarial, e transpor para um cenário educacional e de integração entre duas instituições com finalidades diferentes se caracteriza como inovador!
A GC é um tema ancorado na área considerada “dura” do conhecimento, as engenharias, enquanto a EIP tem seu referencial nas ciências da saúde e humanas. Sendo assim, este estudo exigiu um exercício mental flexível para poder transitar nos dois campos do conhecimento, alinhar os conceitos e apresentá-los.
Metodologia/abordagem
A metodologia utilizada tem raízes no método estruturalista, pois parte da investigação de um fenômeno concreto, eleva-se, a seguir, ao nível abstrato, que represente o objeto de estudo, retornando, por fim, ao concreto. O método estruturalista caminha do concreto para o abstrato, e vice-versa, dispondo, na segunda etapa, de um modelo para analisar a realidade concreta dos diversos fenômenos (MARCONI; LAKATOS, 2007, p. 295).
O estudo partiu da GC e EIP em saúde e seguiu com as reflexões que permitiram alinhar as interações teóricas e as relações existentes entre a criação, sistematização e disseminação do conhecimento, nos ambientes de ensino e serviço em saúde, que pudessem evidenciar a EIP como articuladora dessa integração.
Foi proposto um modelo, representado por meio de figuras, nas quais se apresentam o fluxo do conhecimento presente nos determinantes que influenciam a EIP em saúde. As figuras buscam evidenciar a necessidade de articulação interna (entre os componentes) e externa (entre os determinantes), para que os processos de GC, que incluem a criação, sistematização e disseminação do conhecimento, possam ocorrer nos ambientes de formação e assistência, e ser um elo de integração entre eles.
Principais resultados
Os resultados apontam para o alinhamento dos conceitos da GC e da EIP. A partir deste alinhamento, foram construídos modelos, representados por imagens que identificam o fluxo de conhecimento necessário para integração ensino e serviços em saúde fundamentados na EIP.
Todo processo de EIP se inicia pela identificação de determinantes macro, meso e micro que influenciam o processo de EIP e definem o percurso para os estudantes serem inseridos na rede pública de saúde. Nesse contexto, é muito importante realizar a gestão desses conhecimentos, de maneira que as pessoas responsáveis por inserir e receber os estudantes nos cenários de prática tenham ciência do processo e dos objetivos, e se sintam parte desse contexto. É importante também, definir as formas de compartilhamento das produções, que podem ser específicas de cada um dos sistemas ou determinantes e outras que precisam ser construídas coletivamente. Para tanto, faz-se necessário que, por meio da GC, haja interação ou feedback entre os determinantes macro, meso e micro.
Com essa interação ou feedback, os dados e as informações podem ser compartilhados e apreendidos pelas pessoas, e serem convertidos em conhecimentos tácitos e/ou explícitos que, além de potencializar os resultados de EIP na atenção à saúde, contribuirão para valorização dos atores no processo.
A interação ou o feedback entre os determinantes tem papel fundamental nos resultados que poderão ser alcançados, seja na formação da força de trabalho atual ou futura, no reconhecimento das ações de todos os envolvidos, seja nos resultados na atenção à saúde.
Contribuições teóricas/metodológicas
Diante dos conceitos estudados e alinhados, o conceito de GC aplicado à integração ensino-serviço em saúde adotado neste estudo compreende: agir de forma intencional e inteligente, por meio de processos de criação, organização, registros e disseminação do conhecimento, para tomadas de decisões compartilhadas que contribuirão para mudanças de padrões atuais de atuação, garantindo formação de profissionais que saibam atuar em equipes interprofissionais, de forma colaborativa, e para que melhores resultados na atenção à saúde sejam, consequentemente, obtidos.
O pressuposto é de que a EIP potencialize o elo entre as instituições, e que o conhecimento que permeia essa integração (seja no contexto operacional [aquele que permite que os estudantes estejam nos cenários de prática de acordo com as regras e documentação exigida pelas duas instituições], seja no contexto do cenário de prática [que incluem os saberes acadêmicos, profissionais e da comunidade]) possa ser criado, compartilhado, armazenado, desenvolvido e utilizado com qualidade. Espera-se, assim, que se alcance a formação de profissionais que saibam atuar em equipes interprofissionais, de forma colaborativa, tanto quanto melhores resultados na atenção à saúde possam ser entregues à população.
Sendo assim, para que a GC tenha espaço na integração ensino e serviços em saúde, e que essa prática seja fundamentado na EIP, é importante compreender como se dá o fluxo do conhecimento nas diferentes instâncias (legais, operacionais e dos saberes acadêmicos, profissionais e da comunidade), para implementação das ações nas duas instituições.
Contribuições sociais/para a gestão
Com este estudo, conclui-se que é necessário que se estabeleça a interação, o fluxo do conhecimento e o feedback entre os macro, meso e microdeterminantes que influenciam diretamente a EIP. As boas práticas da GC se constituem em possibilidades para o avanço desta interação e consequentemente para criação, organização, registros e disseminação do conhecimento, capazes de gerar boas práticas na integração entre o ensino e os serviços em saúde, tanto quanto em EIP e práticas colaborativas.
A integração ensino e serviço traz a realidade para o espaço de formação e contribui para aquisição de competências profissionais com o senso crítico que esta aproximação propicia.
É na integração ensino e serviço que estão os diferentes atores que participam da produção social da saúde (profissionais, usuários e comunidade), bem como os professores, preceptores e estudantes, os quais também interferem na realidade e produzem conhecimento.